quinta-feira, 8 de setembro de 2016

o medo das palavras

O medo das palavras é um medo antigo.
Palavras mudam realidades, causam revoluções ou as sufocam, promovem o bem ou o mal ou, ainda, uma zona indeterminada entre um pólo e outro da captura do Real.
Palavras nas mãos de idealistas, poetas e profetas, intelectuais e gente com poder, podem muito! Sim, podem muito!
Por isso, o medo das palavras é um medo antigo.
Um colega de ministério pastoral e amigo  tem escrito sobre "qual palavra você precisa para viver" , ideia extraordinária! pois coloca o leitor diante da reflexão sobre as palavras que amamos, precisamos, são inúteis ou tememos.
Nem sempre as palavras que tememos são ruins, trazem conteúdo negativo ou destruidor. Porque o medo não é apenas o medo do mal/mau. O medo tem muitas gêneses. 
O medo provocado pelo instinto de sobrevivência, pelo egoísmo e pela ganância às vezes temem palavras libertadoras. E o medo do desconhecido, então? o medo das mudanças que não controlamos e que irá nos desinstalar de alguma forma?
E o que podemos dizer do antigo medo das palavras que são utilizadas para rotular os sujeitos portadores de palavras divergentes?
 E, a mais terrível das reflexões, quando nós mesmos devemos nos questionar sobre o que fazemos com as palavras que escolhemos para viver, lutar e morrer.

Eu também tenho medo de certas palavras, mas das que eu não tenho - mesmo que causem a outros temor - elas parecem viver na minha garganta sempre dispostas a escapulir e fazer o percurso cuja volta é impossível.
O mundo foi feito pela linguagem. Este mundo continua sendo feito pela linguagem. Sou gratamente responsável por cada uma das minhas palavras, em especial, aquelas que incomodam a ponto de fazer ressurgir os antigos e autoritários medos.

Pra fechar este texto instigante do Mia Couto sobre os que têm medo que o medo acabe.


sábado, 3 de setembro de 2016

Alguém segure essa ordem

Em tempos de retrocesso  travestido de avanço,  é oportuno olhar para a  história.
No dia 26 de junho de 1999 fui examinada por um concílio de pastores que atenderam a convocação da igreja local, na periferia de São Paulo, nas dependências da própria igreja.  Visto que,  até aquela época, pelo menos,  a tradição conciliar dos Batistas reconhecia que o exame e a futura consagração do ministro era um processo comunitário,  assessorado e não protagonizado pelo Colegiado de pastores Batistas. Fui aprovada pelos colegas.  Em 10 de julho deu-se minha consagração e posse como pastora titular daquela comunidade de fé.
De lá para cá,  tenho transitado, como pastora Batista que sou, em muitas outras igrejas para além da PIB Campo Limpo.
Muita coisa mudou desde então, com maior ou menor importância.
Com cada vez mais frequência, ouço um questionamento sobre a autonomia da igreja e a soberania da mesma em sua relação com as instâncias institucionais que o conjunto das igrejas criou e mantém.
Minha batistice não permite demonizar as instituições em si, mas se inquieta toda vez com  que percebe que as mudanças propostas têm a aparência do bem,  mas são, no fundo, e às vezes explicitamente,  a tentativa de controlar processos individuais e comunitários.
Tutelar ministros e ministras já é um negócio temeroso,  mas criar um imaginário de que é a única forma legitimamente denominacional de ser pastor /a Batista é vil. E está a serviço das capilaridades da cultura dominante: branca,  letrada e viril.
A cereja do bolo indigesto desse momento é ver como alguns estão cordatamente concordando com esse discurso e essa tutela.  Na contra-mão da crescente indiferença que os colegas ministros tem dessa tutela institucional para suas vidas e ministérios.
Sou e serei uma pastora Batista legitimamente denominacional, assim como muitas colegas que vivenciaram outras formas de legitimação comunitária. Então, não pretendo ser filiada à ordem.  Minha submissão irrestrita, no entanto, a Jesus Cristo,  a sua Igreja, aos princípios Batistas e a minha própria consciência.

diálogo no museu da justiça