sábado, 25 de agosto de 2018

A boniteza de florescer em meio a tempos nebulosos



A palavra "boniteza" veio emprestada do educador Paulo Freire como uma forma de invocar uma situação, um evento, uma experiência holística vivida pelo sujeito na qual se percebe o acontecimento da beleza. Invenção muito feliz, inclusive. Creio que esta palavra traduz e sublinha a experiência das mulheres Batistas no Brasil, ligadas à CBB, quando observamos o avanço de sua ocupação no ministério ordenado. Cada narrativa de autorreconhecimento e autonomeação de uma vocação pastoral são tecidas em meio a uma vivaz pertença e serviço comunitário que extrapola, inclusive, o espaço da comunidade local. 
Temos visto ministérios pastorais femininos espalhados por cada região do país e, em sua maioria, em igrejas periféricas que atuam com a compreensão de paróquia, isto é, um cuidado com uma comunidade territorial e afetiva mais ampla. Isso é apenas uma das singularidades da presença das mulheres no ministério Batista. Outras singularidades merecem destaque, mas penso que falar também do quanto nos preocupamos em dar voz aos mais "vulneráveis da sociedade", como enfatizou um padre recentemente em entrevista sobre os escândalos sexuais com sacerdotes na Igreja Católica é importante. Padre Zollner sugeriu mais presença feminina em ministério para que se mantivesse, creio eu, uma sensibilidade na escuta ao outro, um esforço para a empatia que as mulheres ministras parecem se preocupar em manter. 
Nós, pastoras, florescemos, frutificamos de diversas maneiras. Primeiro, nas autotransformações; depois, no refinamento da experiência pastoral, resultado em grande parte de uma relativa tranquilidade em continuar aprendendo com o outro a quem servimos. Poderia falar também da boniteza do temor a Deus que alimenta a espiritualidade das pastoras. A boniteza de suas narrativas de fé e esperança. Tudo isso e ainda muito mais, como resiliência, resistência e persistência, congregam a palavra boniteza em relação  à presença pastoral feminina nas igrejas batistas.    
                    O exercício da vocação pastoral das mulheres tem sido uma celebração eclesial.
Mas o cenário ainda não é adequado a essa realidade eclesial e vocacional. A cena batista tem suas sutilezas. Produz ainda uma sensação vertiginosa entre fraternidade e ódio santo. Ainda vivemos tentativa de cerceamento, pressões e ameaças a quem se coloca favorável a realização de concílios, a quem os convoca como fruto de um desejo comunitário; ainda sofremos as ameaças de ostracismo, ainda temos caças às "hereges" em redes sociais; ainda vivemos uma tensão institucional, mesmo em estados onde a instituição definiu a filiação das pastoras; ainda tememos pelo adoecimento, pelo esgotamento emocional provocado em quem amamos, a nós mesmas e as nossas comunidades de fé com ações e discursos impregnados de ódio. Mesmo que o bom senso e as decisões da CBB já tenham sido acionados. O que ainda temos visto é que em muitos lugares, alguns lideres sugam a alegria de decisões comunitárias, enfeiam a boniteza de servir a Jesus de Nazaré.  Contudo...
Resistimos em florescer! Avançamos em número! Servimos com misericórdia! Construímos sororidade! 
                      Em meio a essa neblina, que pode embaçar a percepção correta do que acontece de belo entre pastoras e igrejas batistas, escolhemos continuar seguindo em frente, sem medo, porque estamos vendo o caminho. 

diálogo no museu da justiça