segunda-feira, 17 de agosto de 2015

migalhas da mesa


O tempo coloca em outra perspectiva aquilo que vivemos. As emoções, os sentimentos mais profundos, as decisões, a execução diária de nossa jornada. Nosso olhar amadurece com o devido distanciamento do vivido. Ficamos mais tolerantes, na maioria das vezes; ou mais impiedosos, caso acreditemos que a balança da vida não tenha sido favorável para nós. Em qualquer situação, no entanto, o tempo funciona como “fiel” da existência.
Na vida cristã, o tempo precisaria ser um instrumento de amadurecimento da nossa compreensão da vida, a nossa e a dos outros. Espera-se sabedoria a partir dos anos de convivência com Jesus em nossas mentes e corações. Espera-se que de aurora em aurora, estejamos mais parecidos com Ele e menos parecido com tudo que signifique um anticristo. Sobretudo porque é mais difícil humanizar-se do que des-humanizar-se.
No texto de Mateus 11,25-30, há uma narrativa contundente sobre expectativas de vida. “Naquele tempo, Jesus disse...” o contexto histórico de Jesus foi o lugar de onde ele próprio via o mundo, as relações humanas – amorosas, políticas, sociais, religiosas – e a espiritualidade com o Pai. O tempo de Jesus não era melhor, nem pior, apenas diferente. Diferentes nomes e personagens, diferentes tecnologias e modos de estar no mundo, mas uma mesma natureza humana. Daí a possibilidade de uma ponte temporal entre a vida e a Palavra.
Como Mestre e portador de uma mensagem divina, Jesus deveria ter esperado que os religiosos de seu tempo o entendessem mais claramente e o ajudassem na proclamação de suas ideias. Quanto tempo ele levou para enxergar que não haveria compreensão dos religiosos e co-cidadãos? Quanto tempo ele levou para entender que a novidade e a simplicidade são temidas antes mesmo de serem vistas? Quanto tempo ele levou para aceitar que não haveria diálogo possível e precisava encontrar outros?
O texto inicia com essa constatação, de certa forma inacreditável e inesperada dentro de uma lógica religiosa, a gratidão por compreender que os sábios e inteligentes não captam o espírito da revelação de Deus, em Jesus de Nazaré, mas os pequeninos do mundo, sim. É do agrado de Deus que os pequeninos entendam e compartilhem a revelação dada por Jesus a eles. É do agrado de Deus que os simples, pobres, os alijados sociais de cada tempo, os que não são considerados sábios, os que ainda não foram contaminados pelo legalismo das religiões ou dele se libertaram, entendam a mensagem e a espalhe.
A mensagem não é pesada, embora tenha sua radicalidade. Ela é, parece, substitutiva do fardo cultural/religioso/social pelo fardo leve de Jesus e, por isso, revolucionária. A mensagem é curativa, pois retira o cansaço, tornando a vida leve,. Logo, ela é transformadora.  
No cenário atual, a fala de Jesus ainda faz sentido. Há de ser grato por ser considerado pequenino. E não o inverso disso. Há de ser grato pela capacidade de identificar tanto os sábios quanto os pequeninos desse tempo. E caso não tenhamos esse discernimento, talvez devêssemos pedí-lo. Pois parece que carecemos de coragem para nos alinhar na categoria dos simples desse mundo e nos manter lá, como opção diária e desafiadora.
Na cena evangélica brasileira, infelizmente, há uma necessidade cristã de se ter clareza se não estamos acompanhando os sábios e inteligentes colocados em seu devido lugar por Jesus de Nazaré, já que no fundo, no fundo, não sabem realmente aquilo que um Deus manso e humilde está falando e fazendo. 

diálogo no museu da justiça