há tardes e pequenos espaços
de tempo
em que uma mulher pergunta
de que adianta
se as mãos dos homens
dirigem o metrô
e os ônibus
os carros blindados
as motos que serpenteiam
entre corredores breves
se as mãos
dos homens
assinam os papéis e carimbam
autorizam o prontuário
a entrada e a saída do corpo
o reconhecimento dos órgãos
doados
se as mãos dos homens
orquestram as violências
balas esporros olhares
e tocam seus instrumentos
fálicos curtos enrugados
colocados para o lado
se os homens e suas
mãos
discam os números
estabelecem os valores
fazem listas de nomes
de outros homens
e se as mãos dos
homens
alcançam todas as coisas
que quebram ou selam
acordos
e apertam botões
que começam guerras
internas
por muitas e muitas
gerações
há um dia em que a mulher
pergunta a si mesma
pergunta para outra
mulher
e as perguntas pairam
flutuam
sobre a cabeça
as perguntas incomodam
e vazam como excremento
de aves
de árvores de céu
nesse dia a mulher procura
a resposta
por que de que adianta
se há mãos que fazem dançar
as cordas
e os pequenos membros
do corpo
vivem em sacolejo
o ventre morre em liminares
gestações
que formam mãos
de homens
e a partir do ventre
as mãos nutridas pela mulher
saem na direção do mundo
de tudo que é externo
de tudo que é global
antropológico
fágico
e social
e a mulher nesse dia pergunta
para outra mulher
para o espelho
de que isso tudo
adianta
(Jarid Arraes)