terça-feira, 20 de agosto de 2024

Uma mulher pergunta

uma mulher pergunta

há tardes e pequenos espaços 
 de tempo 
 em que uma mulher pergunta 
 de que adianta 

 se as mãos dos homens dirigem o metrô 
e os ônibus os carros blindados
 as motos que serpenteiam 
 entre corredores breves 

 se as mãos dos homens 
 assinam os papéis e carimbam 
 autorizam o prontuário 
 a entrada e a saída do corpo
 o reconhecimento dos órgãos 
 doados 

 se as mãos dos homens 
 orquestram as violências 
 balas esporros olhares 
 e tocam seus instrumentos
 fálicos curtos enrugados 
 colocados para o lado 

 se os homens e suas mãos 
 discam os números 
 estabelecem os valores
 fazem listas de nomes de outros homens 
 e se as mãos dos homens alcançam todas as coisas 
 que quebram ou selam acordos 
 e apertam botões que começam guerras internas 
 por muitas e muitas gerações 

 há um dia em que a mulher pergunta a si mesma 
 pergunta para outra mulher 
 e as perguntas pairam 
 flutuam sobre a cabeça 
 as perguntas incomodam 
 e vazam como excremento de aves 
de árvores de céu 

 nesse dia a mulher procura a resposta 
 por que de que adianta
 se há mãos que fazem dançar as cordas 
 e os pequenos membros do corpo 
vivem em sacolejo 
 o ventre morre em liminares gestações 
que formam mãos de homens 
 e a partir do ventre as mãos nutridas pela mulher 
 saem na direção do mundo
 de tudo que é externo 
 de tudo que é global 
 antropológico fágico e social 

 e a mulher nesse dia pergunta 
 para outra mulher
 para o espelho 


 de que isso tudo adianta 


(Jarid Arraes)

Uma mulher pergunta

uma mulher pergunta há tardes e pequenos espaços   de tempo   em que uma mulher pergunta   de que adianta   se as mãos dos homens dirigem ...